Cidades mais humanas e sustentáveis buscam soluções para os impactos causados pela urbanização acelerada
A migração em massa das pessoas que deixaram de viver no campo e passaram a integrar centros urbanos, uma das principais consequências da Revolução Industrial, gerou impactos tão significantes para a sociedade, que, hoje, mais de dois séculos depois, ainda estimula diversos debates sobre as mudanças causadas por essa alta concentração de pessoas, em espaços que estão se tornando relativamente menores quando relacionados ao número de membros que os habitam.
Com o intuito de discorrer sobre as Cidades mais Humanas, Inteligentes e Sustentáveis, as denominadas CHIS, o terceiro dia da Conferência Anprotec (19/09) contou com a presença do diretor do laboratório acadêmico LabCHIS, que também é fundador e diretor presidente da Pi-Academy, Eduardo Moreira da Costa, em sessão plenária com o tema “Do Campo para as Cidades mais Humanas, Inovadoras e Sustentáveis”. A palestra também contou o diretor de administração e finanças do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), Vinícius Lages, como presidente da sessão.
O processo de locomoção em grande escala da população rural para as cidades se deu em ritmo acelerado e frequente, por conta disso, não houve tempo de preparação para esses novos espaços desenvolverem uma infraestrutura que proporcionasse boas condições de vida para receber essa população. Problemas que até então eram inexistentes começaram a se tornar cada vez mais recorrentes, desde então, questões como saúde pública, moradia e mobilidade ainda são questões sem soluções concretas.
A tecnologia disponível atualmente torna possível a identificação e o estudo dessas consequências, no entanto, não é suficiente para mensurar o desenvolvimento da cidade e a qualidade de vida dos moradores. O conceito de Smart Cities, que mede a quantidade de avanços tecnológicos presentes em determinada cidade, muitas vezes é comparado ao das CHIS, porém, o primeiro termo é focado nas ferramentas tecnológicas disponíveis em um ambiente, enquanto o outro envolve o lado humanitário. Para Eduardo Costa, os dois conceitos possuem objetivos distintos. “As CHIS têm foco no cidadão, há uma preocupação de que a tecnologia se torne presente em detrimento dos padrões de vida das pessoas. As Smart Cities consideram os instrumentos tecnológicos que integram tais ambientes, o que é importante também, mas em outra perspectiva. Por exemplo, ao abordar a segurança pública, os parâmetros para classificar as cidades inteligentes levam em consideração a quantidade de câmeras instaladas nas ruas, porém, na prática, sabemos que o fato de haver uma câmera ali não impede, nem diminui o índice de violência. As CHIS têm como objetivo melhorar a qualidade de vida das pessoas”.
O conceito base das cidades, adotado na era medieval, consistia em espaços em que eram possíveis morar, trabalhar e se divertir em um mesmo cenário. Com o início da Revolução Industrial, as fábricas, que são grandes poluentes, tinham de ficar longe das moradias, desta forma, o homem teria que se locomover, diariamente, grandes distâncias de casa para o trabalho, criando, assim, uma separação entre seu ambiente profissional e sua habitação. Com o emprego nas indústrias sendo prioridade, os pilares para melhores condições de vida (moradia, trabalho e lazer no mesmo lugar) deixaram de ser requisitos essenciais para a população.
Os automóveis tiveram um papel fundamental na urbanização, os congestionamentos quilométricos fazem parte da rotina de praticamente todos os moradores de grandes centros. Nas grandes metrópoles brasileiras, o número de carro por habitante chega a aproximadamente um carro para cada quatro pessoas. O índice de mortes e acidentes graves causados nas estradas do Brasil é um fator preocupante, cerca de 47 mil pessoas morrem em acidentes automobilísticos, e mais de 400 mil ficam com algum tipo de sequela. O presidente da LabCHIS aponta o automóvel como um dos grandes vilões da urbanização. “As pessoas deveriam estar discutindo o tempo todo sobre as mortes no trânsito, pois é um número exorbitante. As pessoas não conseguem mais viver sem carro e isso é um problema. Acredito que a indústria automobilística é a nova indústria do cigarro. E quando se fala que tanta gente morre no trânsito, penso que, assim como nas embalagens de cigarro, o carro também deveria vir com um selo na porta escrito ‘este meio de transporte é extremamente perigoso para a saúde’”, afirmou Eduardo Costa.
O LabCHIS, sediado na Universidade Federal de Santa Catarina, tem o objetivo de promover o debate sobre este tema através de workshops realizados pelas cidades do Brasil, partindo da premissa das ações necessárias para tornar o ambiente mais sustentável e de onde elas podem ser desenvolvidas. O projeto já passou por Florianópolis, Rio de Janeiro e Salvador, reunindo participantes de diversas cidades, além de um evento especial que contou com a presença de membros de seis países diferentes.
A sustentabilidade e a tecnologia estão ligadas, não há como evoluir em um aspecto ignorando o outro. Nesse quesito o diretor do Sebrae, Vinicius Lages, destacou a necessidade dessa relação. “É importante pensarmos em cidade, ainda que sejam as cidades inteligentes, no sentido humano e sustentável. A inteligência necessária para desenvolver novas tecnologias depende de seres humanos vivendo de maneira sustentável. Por exemplo, a presença de câmeras e nuvens de dados com informações em tempo real não significa segurança, mas os dados extraídos podem ser estudados e utilizados para buscar soluções que tornem a cidade mais segura, e esse é o papel do homem. E para isso ele precisa ter acesso à educação, moradia, e boas condições de vida no geral”, encerrou Lages.
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